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segunda-feira, 21 de março de 2011

Café da manhã com notícias radioativas e baleias e uns argentinos afogados



Café da manhã com notícias radioativas e baleias e uns argentinos afogados


Hoje, preparando o café da manhã e ouvindo a rádio CBN São Paulo pensava, em meio aos afazeres matinais, que realizava, em princípio, a mesma operação fenomenal antiguíssima de aquecer a água no fogo que no ponto de ebulição a minha chaleira velhinha ainda apita (medida de alerta e segurança) e produz o vapor... Que gira turbinas e motores e locomotivas e gera energia elétrica nas usinas termonucleares, por exemplo.


Em seguida, aproveitei a água fervente que restou na chaleira e, com um obscuro sadismo e prazer, despejei-a fumegante numa procissão de formigas ordeiras pela pia... Depois do auto-de-fé nessas formigas-operárias de morte instantânea, escorri água fria corrente para resfriar mais depressa os ovos cozidos ao mesmo tempo que a água escorria pelo ralo infecto levando no redemoinho as formigas queimadas. Minha pia era um sinistro campo operoso logo de manhã em meio ao caos de trás-os-montes de louça suja e restos de outros carnavais...


As ondas moduladas CBN, irradiavam a via-crúcis da catástrofe nuclear no Japão com pitacos na nossa banal corrupção e má gestão política da coisa pública; mais as matérias de serviços de utilidade pública; mais as deixas jornalísticas subliminares pró-mercado e pró-consumo e, no mais, a chuva, a enchente na cidade, noticiadas como se fossem eventos anuais e comemorativos do calendário judaico-católico. Nenhuma novidade...


Sei lá, em princípio, eu realizava no meu trivial café da manhã a mesma operação de aquecer água e produzir vapor que gira turbinas... Como fazem lá na usina de energia de Fukushima há trinta e tantos anos de bons serviços de energia elétrica e progresso nos finalmente do aparato tecnológico-cientifíco de uma sofisticada e cara engenharia nuclear. Uso gás de cozinha que se vazar tem o perigo de explosão e fogo na minha casa e na vizinhança, todas, de paredes de tijolos aparente. E o meu plano de evacuação civil é catar as minhas gatas com um Deus nos acuda! em meio aos palavrões de praxe, eis que, sufocados por fumaça e poeira tóxicas do fogo e dos escombros... E correr porta afora para a rua longe do desastre como um instintivo animal em fuga. Ao passo que, na usina japonesa usam, como é próprio, o combustível urânio radioativo de alta energia que se explodir e se vazar, libera para o meio ambiente destruição de ogiva nuclear e a letal irrradiação geracional nos seres vivos, na natureza toda, causando, no frigir dos ovos, uma terra desolada chernobyl. E é por isso, que são instalações blindadas com paredes e mais paredes grossas de aço e cimento de altíssima proteção e segurança contra desastres naturais, guerras, ações terroristas.


O rádio dá voz (não de prisão, é claro!) para um diretor nuclear brasileiro que puxa a sardinha radioativa para a brasa da indústria de energia atômica com o canto de sereia do bem estar e progresso que tal energia produzirá para os brasileiros, além, é óbvio: do indefectível classificados de gerar novos empregos (radioativos) com carteira assinada... Finaliza a entrevista com a peculiar vontade de potência dos áulicos de mercado e com as garantias de segurança ISO risco zero, já que falamos de normas do país de fome zero, à esquerda do modus operandi de que governar é o basta fazer publicidade e média (em Portugal pré-desacordo ortográfico).


Elucubro à mesa matinal uma receita de sucesso para o desastre nuclear brasileiro anunciado: jeitinho nacional a gosto com pitadas de gambiarra federal mais colher de chá de improvisação crônica que já joga muito lixo na natureza, quiçá, onde irão jogar o radioativo? Tudo, misturado com xícaras de pacs, copas e olimpíadas pra ontem + E=m.c² + a alta e letal periculosidade potencial da energia nuclear fora de controle quando abalada por eventos aleatórios imprevisíveis e bipolares, próprios dos fenômenos naturais e humanos, que quando: ops! foi mal, desandou a receita, deu merda! Se irradia radioatividade silenciosa, invisível, venenosa, mortal para todos os lados ondulantes por gerações e gerações e gerações de planeta chernobyl, inclusive para o lado dos tubarões corporativo-imperiais, ao sabor de ventos, chuvas, raios e trovoadas da política e gestão cronicamente inviável... Tal receita de castigo nuclear é muito diferente de um desastre natural sem a espada radioativa da síndrome nuclear sobre nossas cabeças que, como inferiu a vontade voluntariosa subliminar do seu Nassif, destrua, por exemplo, a gigantesca barragem de Itaipu, quando, então, o tsunami de água doce correria a 600 km por hora de escombros e caos para um só lado: para as bandas platinas de los hermanos portenhos... Oh! Pobres coitados adoradores de tangos y milongas, fatídicos por natureza austral ou astral (tanto faz), que do azar à jusante de mercosul e futebol muy amigos se afogariam de salto alto no dilúvio do pecado da soberba e do mau gosto fashion.


Retomando a lucidez e a tolerância, depois do suco de maracujá... O calcanhar de Aquiles disso tudo, foi que no antípoda Japão houve o desencadeamento de eventos naturais de grande magnitude destrutiva de difícil previsão, controle e medida científica confiável das implicações em cadeia... Mesmo para o avançado país preparado e previdente que, no entanto, o cataclismo revelou à tona ações, atos e atas, previsíveis, banais, óbvias da tragicômica condição humana capitalista: a ganância corporativo-financeira que fraudou relatórios essenciais de controle, inspeção e segurança da indústria de energia nuclear, apesar de não termos notícias ainda de haraquiri de lesa humanidade de ceos, diretores, burocratas estatais, políticos, banqueiros, acionistas de traje gordo do crime organizado global.


Sabe-se também que abnegados heróis: trabalhadores, bombeiros, voluntários civis se apresentam e marcham para o sacrifício como que kamikazes pós-tudo a enfrentar o perigo e a “bela morte” em meio à fala do imperador na TV e o alto risco de contaminação radioativa e câncer, na tentativa de controlar a operação dos reatores explodidos; resfriar a usina do fogo nuclear e salvar vidas inocentes, salvar cidades japonesas e mananciais vitais, salvar gerações futuras do planeta. (o sábio Borges, numa passagem (labiríntica) disse: “qualquer destino, por longo e complicado que seja, consta na realidade de um único momento: o momento em que o homem sabe para sempre quem é”.).


Depois do fausto café com notícias radioativas, fiz uma varredura rigorosa na pia e adjacências e me certifiquei com satisfação triunfante que não sobrou nenhuma formiga viva para contar o fim da história. Então, fui dar carinho e atenção para minhas gatas. E pensei um pouco mais: que não se fala no noticiário da catástrofe do Japão de gatos e cães e aves e animais domésticos abandonados à própria sorte... Nem se fala mais da matança de baleias caçadas, brutalmente, cinicamente, ilegalmente, pela indústria da pesca japonesa que até invade seus santuários glaciais e tudo, para alimentar a ganância do mercado gastronômico dissimulado no marketing das boas intenções de arraigados costumes do povo japonês e de uma pretensa mistificação da caça assassina de baleias em nome da pesquisa científica. Há que se revolucionar o mundo com uma suprapolítica ou, então, nos rendermos aterrorizados a uma nova ordem corporativo-imperial totalitária à espreita atroz... Basta faltar água nas casas e comida nas mesas da consciência familiar-burguesa.


Bem, vou resfriar minha cabeça nuclear, vou caminhar no parque nesse dia de sol ameno de dia agradável de caminhar. Pensar na vida do pintor Cézanne, cuja biografia estou lendo e que junto com van Gogh e Gauguin, todos, embebidos de traços da exotique gravura japonesa inventaram e inauguraram, a frente do seu tempo, a pintura moderna e, no entanto, viveram vidas de artistas-párias, zombados, atormentados, sem o reconhecimento artístico pelo establishment político-burguês contemporâneo e, muito menos, sem o fair play de convites para festas nos salões acadêmicos de Paris ou da POA... Pensar na maciça montanha sagrada de Sainte-Victoire, tão reverenciada na arte de Cézanne, a se destacar, desde o civilizador império romano, como a fortaleza inexpugnável que domina a paisagem ensolarada e árida da mediterrânea Provença.


Droga! Formigas sei-lá-de-onde retomam a marcha enfileirada pela pia de imundície. Oh! Deus, oh céus... Que fazer? Se, então, minhas gatas queridas e chatinhas se alimentassem como os tamanduás... Contudo, penso que daí, elas não seriam mais felinos da natureza, talvez, uns monstrinhos mutantes do imaginário de guerra nas estrelas... Ah! A natureza objetiva indiferente "sem causas finais, nem causas eficientes, senão, o jogo do acaso e da necessidade” frente às ações humanas projetivas e as promessas de felicidade das ideologias de boas intenções político-religiosas dos diabos! Dos pretensiosos, arrogantes, mistificadores donos do poder cheios de si – cheios de ilusão antropocêntrica.


Após o café da manhã com tudo isso de iguarias, tomei a grave decisão de limpar a pia... Ouvindo no rádio música para se limpar uma pilha de sujeira.


De passagem pelo planeta... Da caminhada no parque pela trilha da floresta, trouxe de presente da natureza para a poesia o haicai 169:


                                  haicai 169

                                  no caminho zen
                                  mancha azul-lilás cresce!
                                  borboleta desperta

                                  jc.pompeu, mar 2011 


                                 
jc.pompeu, mar 2011